Parte I: A Religião Em Marx, ou Melhor, a Falta da Mesma

“Forewordzinho”:

O que é a história do comunismo, sem ser uma quantidade enorme de traições, facadas e expurgos? Hegel cria uma teoria fenomenológica e ontológica, ao qual busca explicar todas as formas do espírito, Marx reduz muito da teoria de Hegel a uma crítica política e de um momento específico (capitalismo) A teoria materialista de Marx tornada em teoria positivista por Engels, o socialismo científico do mundo industrializado de Engels é traído pelo capitalismo de estado de Lenin num país agrário, a teoria libertária e anti-reacionária de Lenin transformada em um processo monstruoso de expurgos e nacionalismos de Stalin... E agora outra traição acontece no coração da esquerda, de ostracizar, remover e abolir a minha pessoa, os motivos? Ninguém sabe, teorias da conspiração sem nenhuma base ou fim, ódio irresponsável e bizarro contra uma pessoa inocente, entre outras.

Sê esses chamados “esquerdistas” (que não são, não existe radicalismo sem práxis alguma, como Mao dizia: "Os camaradas que estudam filosofia deveriam deixar a universidade nas férias e ir para o interior") pudessem olhar para a sujeira que estão fazendo em nome de uma opressão sem sentido algum, negando a práxis, apoiando ideologias liberais e medindo pensadores e líderes como fossem um cartas de Yu-Gi-Oh, notariam que somente através da união de toda esquerda, um sistema maleável e aberto e sob o objetivo de uma revolução particular verdadeiramente brasileira, notariam que esse bullying e alienação não passam de doenças infantis dentro do comunismo.

Somente sobre o pensamento unificado de toda a classe, sobre o objetivo vanguardista e histórico que o marxismo verdadeiramente pode existir dentro da sociedade brasileira, e é de bom grado de todos nós, verdadeiros socialista, que o ostracismo a pessoas aleatórias e a violência contra pessoas sejam colocadas na lata de lixo da história, junto com os fascistas e seus defensores canibais social-democratas (ao qual esses "libertários" sempre estiveram em conluio).



Atenção, atenção! A Vanguarda do Atraso ataca novamente, agora contra a Religião alheia! Como sê a relação do Marxismo com a religião já não fosse discutida milhares e milhares de vezes pela: crítica aos jovens hegelianos de Marx, pela visão positivista de Engels, pela proibição gritante de Lenin a religião, pela crítica a tais opressões ao pensamento religioso por Bogdanov e parte da esquerda bolchevique, pelos movimentos revisionistas (infelizmente) de teologia da libertação, pelas lutas decoloniais na Irlanda, Índia e Africa que utilizam muitas vezes a religião como símbolo, pela própria critica da igreja católica ao comunismo, por Dorothy Day e anarquistas cristãos… Mas essa maldita conversa continua infectando os lugares mais podres da esquerda moderna, de um lado: o ateu cientificista que caiu no marxismo Deus (sê me dão o direito) sabe como, esse trabalha reduzindo a vida a biologia e economia, utiliza de termos totalmente fora do marxismo como: utilitarismo e monismo, faz de Marx uma versão deformada de uma síntese inexistente de Ricardo e Hegel! Do outro: o radical religioso, aquele que mistura e prostitui Cristo para sua ideologia patética e faz de Cristo um Barrabás meia boca: um mero revoltoso político tal como Cathelineau ou, em casos piores, Robespierre! Nenhum desses lados tem a resposta, marxismo prostituído em favor de crenças pessoais não é marxismo, somente por uma análise verdadeira das condições e relações dentre as formas de crença e sociedade que somos capazes de criar uma forma verdadeira da religião e do homem religioso, esse é o papel básico de todo marxista.

É um erro imenso dizer que Marx aborda o papel da religião dentro da sociedade. As suas únicas críticas fortes podem ser encontradas dentro da Miséria da Filosofia e Crítica do Programa de Gotha, a frase mais popular dentro da crítica a religião, é erroneamente associada ao ateísmo: "A miséria religiosa é, de um lado, a expressão da miséria real e, de outro, o protesto contra ela. A religião é o soluço da criatura oprimida, o coração de um mundo sem coração, o espírito de uma situação carente de espírito. É o ópio do povo." Essa frase não fala da religião em sentido negativo, ela é no máximo um acertamento político a um pensamento comum na época. Arnold Ruge, Feuerbach e David Strauss dentre outros nomes compõem uma crítica (muitas vezes justíssima) à religião alemã. Na verdade, esse nem é o ponto máximo da religião e a crítica dela no pensamento marxista, uma crítica muito mais política e dura é feita no Programa de Gotha, em resposta a Social Democracia Alemã: “[...]de que a liberdade de consciência burguesa não é mais do que a tolerância de todas as espécies possíveis de liberdade de consciência religiosa e que ele se esforça, antes, por libertar a consciência do fantasma religioso. Mas, acha-se por bem não ultrapassar o nível 'burguês'”.(https://www.marxists.org/portugues/marx/1875/gotha/gotha.htm) É um texto verdadeiramente ateu, sem sombra de dúvidas, mas o fato de apontarem a introdução da Crítica a Hegel ao invés dessa passagem (o certo seria não apontarem para nenhuma, Marx tem dezenas de textos e nenhuma passagem ou texto deve ser visto em sua totalidade como fonte principal do "Marxismo") demonstra a incapacidade completa dos ditos "marxistas" brasileiros.

Na verdade, a introdução à Crítica do Direito deve ser vista como uma crítica à crítica hegeliana ao cristianismo, ela critica tanto seu método como sua conclusão. Começaremos vendo a crítica hegeliana ao cristianismo e depois passaremos pela sua crítica. A religião para os Hegelianos tem um sentido bem estrito, a religião é uma forma de autoconsciência, sendo essa o processo ao qual o humano usa algum apetrecho lógico para a formação do sujeito, devemos ressaltar o uso da palavra lógico, que não é relacionado a proposições, conectivos e argumentos, mas sim o Ser (Sein) revelado através do pensamento ou palavra, a lógica é um formato ontológico para a formação do Ser dentro de um espaço, é a formulação do verdadeiro e a entidade do real através do discurso, a lógica existe dentro do espaço como uma formulação conhecida da realidade, um Ser é produzido através da Verdade e do conceito, através do método lógico-real, para o homem religioso a constituição de si próprio parte através de um movimento lógico-real a constituição meramente abstrata e não real do objeto em questão.

O problema religioso não é psicológico como Freud aponta: “A religião é comparável a uma neurose da infância", não querendo fazer o mesmo erro dos “marxistas” de querer diminuir a literatura completa de um intelectual a duas ou três frases sem contexto nem histórico nem social, mas Freud está certo em partes, a religião é de certa forma uma ilusão ao qual o homem se auto-escraviza, mas ela é parte de um conceito histórico e social, tanto como é uma forma do Ser em questão de transformar-se e criar uma abstração (entidade) através do meio ao qual se encontra, a religião muitas vezes tem um caráter necessário e não dispensável como o cientificismo do século XIX tenta passar. Temos também por exemplo, religiões ao qual utilizam da psicologia, mesmo que bem pouco desenvolvida, Buda muitas vezes utiliza de análises pouco metafísicas e bastante psicológicas, o objetivo de Buda era fazer uma filosofia ao qual ignorava questões tal como divindades em favor de um sistema lógico (sentido não-hegeliano) ao qual uma pessoa poderia achar a libertação, temos também o exemplo de Santo Agostinho, que utilizava de psicologia arduamente no seu texto “As Confissões” para saber os motivos do pecado.

O erro religioso, é necessariamente a falta da raiz dialética dentro da própria produção do ser, não querendo adequar todas as religiões a um projeto megalomaníaco de homogeneidade e semelhança, isso é extremamente antimarxista, notamos sim uma heterogeneidade de pensamentos e filosofias dentro do âmbito religioso. A cultura católica impôs brutalmente sua concepção religiosa a outras religiões, religiões tal como a hindu não possuem coisas tal como livro central, autoridade temporal e figura messiânica principal, possuímos uma simples e notável forma de vida e algumas autoridades (Vedas, Adi Shankara e Krishna), mas todas essas formas não possuem a superação do ser, ou o desenvolvimento completo dele, são parentes de outras formas de formação do ser, ao qual sempre ignoram a dialética, ao qual somente é formada através da formulação do estado científico,tanto para Hegel, na formulação de um estado Ateu, como para Marx na destruição e superação das relações arcaicas, capitalistas e sociais.

Superado o meio religioso através da formulação de um Estado (não num termo político, mas num contexto social) ao qual o Ser (Sein) e não o Ser-outro (Gegen-stand, objeto) toma conta do Homem (formulada o Estado realmente dialético) a realidade muda e somente assim a superação religiosa é cogitada. A superação religiosa é um processo, e não uma atividade marxista tal como a tomada de poder, a centralização da economia ou a formação de Sovietes..

Marx critica as formulações idealistas de Feuerbach e sua turma por curta duração da Crítica na Filosofia do Direito de Hegel (notadamente, nossos comunistas ainda não desenvolveram a vontade de ler seu próprio pai), mas leremos para essas pobres almas:

Na Alemanha, a crítica da religião chegou, no essencial, ao fim. A crítica da religião é a premissa de toda crítica A existência profana do erro ficou comprometida, uma vez refutada sua celestial oração pelo lar e pelo ócio. (MARX,1843, 1)

Aqui temos uma crítica a crítica já comum dentro do meio alemão, ele (comum em Marx) zomba e polemiza a respeito dos Jovens Hegelianos, dizendo que "A crítica da religião é a premissa de toda crítica." já demonstrando comum o pensamento Irreligioso dentro da Alemanha na época, ainda critica mais ainda que "A existência profana do erro ficou comprometida" demonstrando quanto a crítica à religião na Alemanha toma um rumo extremo.

O homem que só encontrou o reflexo de si mesmo na realidade fantástica do céu, onde buscava um super-homem, já não se sentirá inclinado a encontrar somente a aparência de si próprio, o não-homem, já que aquilo que busca e deve necessariamente buscar é a sua verdadeira realidade. (MARX,1843, 1)

Vemos aqui uma das críticas hegelianas a religião, a religião como a centralidade do não-ser sobre o âmbito ontológico e a busca lógica do ser em relação ao seu ambiente.

A religião não faz o homem, mas, ao contrário, o homem faz a religião: este é o fundamento da crítica irreligiosa. A religião é a autoconsciência e o auto sentimento do homem que ainda não se encontrou ou que já se perdeu. (MARX,1843, 1)

Continuamos na explicação de Marx sobre o pensamento alemão, dando os fundamentos da crítica irreligiosas, e pega na lógica Hegeliana da formação do homem, a religião como sendo um instrumento na formação do homem, instrumento nesse, com um tom bem negativo, comparando o homem religioso a um homem ao qual não encontrou sua realidade dialética.

Mas o homem não é um ser abstrato ou isolado do mundo. O homem é o mundo dos homens, o Estado, a sociedade. Este Estado, esta sociedade, engendram a religião, criam uma consciência invertida do mundo. (MARX,1843, 1)

Crítica dura e total a Robinsonadas idealistas, a religião não parte de uma forma psicológica ou independente do homem, e sim através de um desenvolvimento social dentro do cerne da existência humana, o Estado é uma das várias formas que o homem tem de formar seu Ser (Estado e igreja são sinônimos da literatura marxista, mais tarde o texto abordará esse quesito).

A religião é a teoria geral deste mundo, o seu compêndio enciclopédico, a sua lógica popular, a sua dignidade espiritualista, seu entusiasmo, sua sanção moral, seu complemento solene, a sua razão geral de consolo e de justificação. (MARX,1843, 1)

Demonstra, um caráter positivo a existência da religião, a religião toma agora o sentido totalmente positivo, como uma forma de determinação e ciência geral dentro da comunidade humana.

É a realização fantástica da essência humana porque a essência humana carece de realidade concreta. Por conseguinte, a luta contra a religião é, indiretamente, a luta contra aquele mundo que tem na religião seu aroma espiritual. (MARX,1843, 1)

Aqui a religião já toma um contexto negativo, como uma formulação errônea e não-negadora ou negativa dentro do ser humano, a luta contra a religião não é uma luta contra a religião, mas sim uma luta contra o misticismo religioso, "luta contra aquele mundo que tem na religião seu aroma espiritual."

A miséria religiosa é, de um lado, a expressão da miséria real e, de outro, o protesto contra ela. A religião é o soluço da criatura oprimida, o coração de um mundo sem coração, o espírito de uma situação carente de espírito. É o ópio do povo. (MARX,1843, 1)

A palavra miséria, pode ser entendida como a forma da demonstração religiosa, a miséria religiosa é uma expressão da opressão do homem contra o homem, na busca da formulação da verdade.

A verdadeira felicidade do povo implica que a religião seja suprimida, enquanto felicidade ilusória do povo. A exigência de abandonar as ilusões sobre sua condição é a exigência de abandonar uma condição que necessita de ilusões. Por conseguinte, a crítica da religião é o germe da crítica do vale de lágrimas que a religião envolve numa auréola de santidade. (MARX,1843, 1)

Aqui, Marx aponta que a religião é uma falsa felicidade, mas mais que isso, faz uma crítica direta aos Idealistas Hegelianos ao qual colocam o abandono das ilusões do homem como uma forma específica e direta, sem notar as qualidades verdadeiramente materiais do homem em questão.

A crítica arrancou as flores imaginárias que enfeitavam as cadeias, não para que o homem use as cadeias sem qualquer fantasia ou consolação, mas para que se liberte das cadeias e apanhe a flor viva. (MARX,1843, 1)

Aqui o texto faz uma coisa interessante, colocar que a religião não é a cadeia em si, a religião na verdade é aquilo que enfeita a cadeia, a abstração da entidade não é parte da religião e sim um processo de múltiplas entidades, Marx mais tarde conclui que para que o homem se liberte da cadeia em si, e se torne um ser de verdade, precisa no processo acabar com a política, fazer uma crítica à economia, sociedade e estado burguês e não parar somente na religião, que são enfeites para a verdadeira opressão. Liberado do enfeite, o homem pode se libertar da cadeia e assim se tornar um ser.

A crítica da religião desengane o homem para que este pense, aja e organize sua realidade como um homem desenganado que recobrou a razão a fim de girar em torno de si mesmo e, portanto, de seu verdadeiro sol. (MARX,1843, 1)

A crítica à religião idealista, ao qual a maioria dos comunistas sê escrevem, nada mais é que uma forma reestruturada do humanismo Feuerbachiano, o homem deixa das armadilhas religiosas para se adentrar na sua própria armadilha, ainda não livre das amarras que o compõe.

A religião é apenas um sol fictício que se desloca em torno do homem enquanto este não se move em torno de si mesmo. (MARX,1843, 1)

Aqui ele retoma a ideia do Sol, não no sentido positivo, mas no sentido negativo (além disso, caso você tomar a formulação Althusseriana, esse contexto fica pior ainda), o ateísmo nada mais é que outra forma de formulação errônea do Ser ao tentar se encontrar e formar sua entidade dentro do contexto da verdade, assim sendo necessário a superação do meio ateu tanto quanto do meio religioso.

Assim, superada a crença no que está além da verdade, a missão da história consiste em averiguar a verdade daquilo que nos circunda. (MARX,1843, 1)

Outra fonte incessante de conhecimento dentro do pensamento de Marx, a ideia de não parar somente no ateísmo, mas de criticar e analisar o meio histórico de forma extremamente forte, tentando na análise, superar as formas espirituais e idealistas na formação da verdade.

Como primeiro objetivo, uma vez que se desmascarou a forma de santidade da auto alienação humana, a missão da filosofia, que está à serviço da história, consiste no desmascaramento da auto alienação em suas formas não santificadas. Com isto, a crítica do céu se converte na crítica da terra, a crítica da religião na crítica do direito, à crítica da teologia na crítica da Política. (MARX,1843, 1)

A crítica de Marx ao sistema religioso não é pelo sistema religioso, e sim ao sistema ateu e filosófico não-religioso também, é uma dura crítica e um enorme processo dialético na busca pela verdade ao qual circunda todas as entidades e todos os Seres e Não-Seres no processo histórico.

"A crítica da teologia na crítica da Política."

Nenhum outro tipo de frase pode definir o gênio de Marx, a crítica para a religião, já produzida por Hegel, e em formação pelos jovens hegelianos, se converte agora em uma crítica à política, as próprias formas de diferenciação, anarquia e desordem que peneiram dentro do sistema capitalista. A crítica de Marx é inexistente, é uma crítica a crítica, formando outra crítica no processo, a crítica principal a política e a fundação do homem na terra, e a crítica à política tanto como a igreja como forma naturalmente política é o que veremos na próxima sessão.